Drones Armados na América Latina e Caribe: Uso por Grupos Armados não Estatais e o Aumento da Insegurança Social
- Júlia Marcon
- 17 de jul.
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Drones têm sido utilizados em larga escala no conflito entre Ucrânia e Rússia, protagonizando ataques direcionados de alta letalidade. No Oriente Médio, os veículos aéreos não tripulados desempenham um papel central em ofensivas militares e operações de precisão, demonstrando seu potencial para transformar profundamente os cenários contemporâneos de guerra e introduzir novas dinâmicas na segurança internacional. Na América Latina e Caribe, essas tecnologias também foram rapidamente incorporadas, impactando setores como segurança, defesa, logística e monitoramento ambiental.
Entendendo os impactos do aumento do uso de veículos aéreos não tripulados na região, a Red de Seguridad Humana en América Latina y Caribe (SEHLAC) publicou um monitor que teve como objetivo principal mapear e analisar dados referentes ao desenvolvimento, comercialização e uso de drones na América Latina, tanto por atores estatais quanto por atores armados não estatais. A SEHLAC é uma rede de profissionais especializados no Direito Internacional Humanitário (DIH) e nos Direitos Humanos (DH) que lutam pela segurança humana e pelo desarmamento humanitário na América Latina. Logo, o monitor publicado pela rede de pesquisadores busca evidenciar a importância de uma agenda de segurança centrada nos direitos humanos, na transparência e no controle democrático de novas tecnologias militares, levando em conta as particularidades geopolíticas de nosso continente.
O trabalho metodológico para a realização da pesquisa baseou-se na coleta de notícias em plataformas digitais de outubro de 2024 a fevereiro de 2025 e evidenciou-se que, na América Latina, os drones foram adotados pelos Estados principalmente para o controle fronteiriço e combate ao narcotráfico e crime organizado. Essas tecnologias, entretanto, não limitaram-se apenas ao uso estatal e rapidamente passaram a ser utilizadas por grupos armados não governamentais, aumentando a insegurança na região e levantando preocupações quanto a sua regulação e uso indevido. Logo, entende-se que a proliferação do uso dessas tecnologias a nível mundial se tem replicado também em nosso continente, aumentando sua demanda nos âmbitos civis e militares e transformando setores chaves na região, como segurança e defesa, tornando necessário que ocorram debates muito particulares, a partir da realidade latina.
O monitor da SEHLAC aponta que a maioria dos drones utilizados na América Latina, tanto no setor militar quanto no civil, são provenientes de outros países, como EUA, China, Israel, Irã, Turquia e Rússia, resultando em uma preocupação em relação à possível influência geopolítica de potências estrangeiras na região, o que poderia acarretar na perda de autonomia da América Latina frente a esses países. Apesar disso, o estudo aponta também o aumento do desenvolvimento da produção dessas tecnologias no continente, tendo sido identificados, em 2021, 39 fabricantes e integradores ativos de hardware de drones na região.
Estes grupos se referem a pequenos produtores focados em satisfazer requerimentos específicos de setores civis como a agricultura, a mineração e a silvicultura e, nesse contexto, o Brasil é o país mais desenvolvido na América Latina na produção de drones, sendo possível mencionar empresas como a AGX Tecnologia, XMobots, Aerodyne Brazil e Horus. Outros países com empresas de destaque são Argentina (Aerodyca e Vantac), México (Dronak, Helidoid e Citadelta) e Colômbia (Orkid e Advector). Na produção de drones com objetivos militares, o Brasil também é líder no continente a partir da atuação de empresas como a Embraer e a Avibras, que possui, inclusive, associação com a Força Aérea Brasileira (FAB).
Os principais fatores que explicam a crescente demanda por drones na região estão relacionados à segurança, ao combate ao crime organizado e à preservação ambiental. Países como México, Colômbia, Brasil e Peru utilizam dessas tecnologias sobretudo para reforçar a vigilância em áreas de fronteira e em regiões remotas, visando conter o tráfico e outras atividades ilícitas. Além disso, Brasil e México empregam drones para monitorar zonas urbanas marcadas por altos índices de criminalidade e pela presença de cartéis, permitindo às autoridades acessar em tempo real informações estratégicas de locais de difícil alcance. No campo ambiental, Brasil e Peru destacam-se no uso de drones para proteger a Amazônia, combatendo a mineração ilegal, o tráfico de espécies, incêndios e o desmatamento. Também se intensifica o uso desses equipamentos no monitoramento de recursos hídricos e naturais, contribuindo para a formulação de políticas ambientais mais eficazes e para a gestão sustentável dos ecossistemas.
Entre os meses analisados no Monitor da SEHLAC (outubro 2024 - fevereiro 2025), a região vivenciou um aumento significativo do uso ilícito de drones em ataques explosivos, transporte de drogas e vigilância ilegal por grupo armados não estatais, especialmente na Colômbia e no México. O crime organizado mexicano adpatou drones equipados com explosivos e minas antipessoais, afetando regiões como Michoacan, Guerrero y Chihuahua, com ao menos 9 militares feridos em razão des ataques que contaram com a utilização desses equipamentos. No caso colombiano, grupos armados como o Estado-Maior Central (EMC) e o Ejército de Libertación Nacional (ELN) incorporaram drones comerciais modificados para lançar explosivos em suas operações. Entre outubro e dezembro de 2024, se registraram no mínimo 20 ataques com drones realizados por esses grupos, muitos dirigidos a estações policiais e bases militares. Levando em conta essas ações, é necessário reiterar os impactos humanitários resultantes, representados pelo registro de feridos e danos para infraestruturas de uso civil. Em fevereiro de 2025, por exemplo, um ataque de drones em Cauca, na Colômbia, provocou o deslocamento forçado de mais de 1000 pessoas. Na América Latina, deve-se mencionar também que os drones surgem como uma ferramenta essencial para o narcotráfico, sendo utilizados no transporte de drogas (especialmente fentanil) e contribuindo para o aumento da criminalidade, o enfraquecimento das estruturas sociais e o desgaste dos serviços de segurança.
O aumento do ataque de drones por parte de grupos criminosos impulsionou os governos a adotarem tecnologias e estratégias para neutralizar essas ameaças e, entre 2024 e 2025, países como Colômbia, México, Argentina, Brasil e Equador implementaram sistemas anti-drones, com o objetivo de localizar, identificar e neutralizar sistemas não tripulados de organizações armadas não estatais. Um caso referente a esse tipo de operação foi a instalação de uma Central de Monitoramento Anti Drones (CMA) pela Polícia Federal na Cúpula do G-20, em novembro de 2024, no Rio de Janeiro. O objetivo da operação era proteger áreas sensíveis do evento, como aeroportos e hotéis, e, em 24 horas, cerca de 20 drones não autorizados foram detectados e interceptados e o esquema anti drones, considerado inédito no Brasil, pode ser entendido como um caso que apresentou resultados positivos.
Em razão da grande quantidade de incidentes envolvendo grupos armados não estatais, começaram a surgir, dentro dos âmbitos governamentais, discussões sobre a necessidade de estabelecer regulações para o uso de drones, buscando evitar que essas tecnologias sejam utilizadas para fins ilegais. Entretanto, na maioria dos países latinos e caribenhos, não existem normas claras que regulem o próprio uso estatal de drones, o que permite sua implementação sem controles adequados sobre privacidade, direitos humanos e uso da força. Como mencionado anteriormente, muitos governos passaram a incorporar drones para a vigilância de fronteiras, principalmente para combate ao narcotráfico e, nesses contextos, a ausência de regulações permite que esses mecanismos sejam utilizados sem a devida transparência por parte dos Estados.
Referência
Redação: Júlia Marcon










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